quarta-feira, 16 de março de 2016

Capítulo IX A Mulher Altar e o Grande Rito e X O silêncio dos inocentes

Capítulo IX A Mulher Altar e o Grande Rito
Alex Sanders (Criador da tradição Alexandrina) iniciando nova bruxa. Ao fundo Maxim Sanders, sua esposa e sacerdotisa


Durante todo aquele sábado as perguntas e a dúvida não saiam de minha mente. Não tinha conseguido fechar os olhos e dormir nem um minuto. Não sabia por que do abandono e agora do retorno de Mariah. Não sabia como tinha perdido minhas habilidades e nem se voltaria a tê-las, aliás, se queria tê-las. Não sabia mais o que era verdade ou imaginação. Acho que foi o pior sábado de toda a minha vida.

Era agora um jovem de 19 anos de idade, que já tinha passado por muita coisa. Muitas experiências dos mundos físico e espiritual, mas mesmo assim, aquele novo desafio me era desconhecido.
É claro que sentimentos muito negativos rondavam minha mente. Mágoa, raiva, dúvida... mas ao mesmo tempo eu só podia “arranhar” o que seria me tornar um sumo-sacerdote. Quais as responsabilidades que viriam com isso? Quais as habilidades? No que minha vida se transformaria?

Ainda hoje eu acredito que as dúvidas e as possibilidades que envolviam a decisão, é que me levaram a realmente aceitar aquele convite. E a partir da minha decisão em aceita-lo é que a ansiedade cresceu sem limites. Alguns anos mais tarde eu aprenderia que deveria fazer o que desejasse, sem ânsia de resultados, ou seja, a ansiedade era um “câncer” para o magicista.

A noite de sábado para o domingo não foi nada diferente. Nem um minuto de sono. A essa altura o corpo dava sinais de esgotamento, mas por mais que tentasse, não conseguia relaxar. Ver Mariah de novo após seu longo silencio fazia com que minha mente se tornasse uma usina de sentimentos desconexos. Eu sentia muita raiva do abandono e mesmo das experiências degradantes e dolorosas como do ataque de gastrite, mas ao mesmo tempo, sentia falta do apoio, amor e instruções de Mariah.
Não vou negar ao leitor que o Mal é sedutor. Mesmo não me dando conta de que esse Mal era meu senhor (não custa lembrar ao leitor que sempre acreditei estar ao lado do Bem) eu me encantava com as capacidades que ser um sacerdote me proporcionavam. Sentia muita falta dos “poderes”, de poder manipular e influenciar pessoas ao meu bel prazer. Só isso já deveria ter me servido como alerta sobre o Mal naquela época. Mas eu era jovem e, apesar do grande conhecimento e experiência de vida com apenas 19 anos de idade, a imaturidade da jovialidade me era comum.

Acho que apenas a adrenalina que aumentava a cada hora passada, o aproximar da hora marcada é que me mantinha acordado.

Evidentemente que comecei a me aprontar para o encontro com bastante antecedência. Perdi a conta de quantas vezes experimentei aquele Robe, aquela veste que sabia ser a veste do Sacerdócio Mor. Tentei me alimentar, mas apesar do estômago vazio não dar sinais da já companheira gastrite, não conseguia me alimentar.

Quando ainda faltavam mais de quarenta minutos, não aguentei e desci para a portaria, esperando pela chegada de Mariah, como já havia feito por outras duas vezes antes.
Ela chegou para me buscar, parou a frente do meu prédio e fez um sinal com a cabeça para que eu entrasse no carro. E assim eu o fiz.

Minha vontade era de sacudi-la pelos ombros, gritar e questionar por satisfações. Um sorriso de Mariah me desarmou completamente:

-Olá querido. Não pergunte nada, não questione nada. Ao final dessa noite você terá todas as respostas. – Ela me disse sorrindo.

No entanto, aquela falta de satisfação me bastou. De certa forma eu queria perdoar. Eu queria compreender e não queria mesmo perder aquele vínculo de amor que tinha montado com minha iniciadora. Meus sentimentos por ela eram um misto de amor de filho, misturado com admiração, mas é claro que apesar da pouca diferença de idade (Mariah era apenas alguns anos mais velha), também existia um sentimento diferente, uma tensão quase sexual entre nós.

Desta vez eu não fui vendado. Não existiriam mais segredos para mim, afinal, era hora de me tornar o suprassumo, o ápice do que se pode chegar na bruxaria.

Pela primeira vez soube ao certo onde eu era levado nas minhas iniciações e em que local as passagens mais fortes de minha vida tinham se dado.

Mariah estacionou o carro em frente ao portão de madeira que nos daria entrada a casa que me referi por anos como “a casa verde”, simplesmente, pois era toda verde. Portas, Janelas, paredes, grades, enfim, não existia outra cor naquela casa.

Fomos até a mesma área ritualística na qual tinha vivenciado as duas iniciações anteriores. Lá estavam o Altar montado, os quadrantes indicados, o círculo traçado no chão de terra.
No meio do círculo encontrava-se uma toalha negra com um grande pentagrama dourado pintado em seu centro. Aquilo me chamou atenção, pois em nenhuma das duas cerimônias anteriores essa toalha podia ser visível. Reparei também que em um canto, num mini altar colocado a nordeste, um crânio repousava junto a fotos de ancestrais que reconheci imediatamente (muitas daquelas mesmas fotos me haviam sido presenteadas por Mariah desde minha primeira iniciação). O crânio tinha diversas fitas coloridas presas a ele por pingos de velas, e mais tarde vim, a saber, que aquela era a representação do guardião espiritual de nossa tradição.

Sobre o altar principal estavam o chicote (usado na minha primeira iniciação como símbolo de purificação), o Athame, mas algo me chamou imediatamente a atenção: Um Cálice muito maior que o comum.

Existe uma parte da cerimônia da Bruxaria chamada de “O GRANDE RITO”.

Inicialmente esse grande rito se apresenta aos praticantes como uma prática simbólica, onde o Athame (adaga ritualística) e inserido no cálice em determinada hora da celebração. Esse ato seria o simbolismo da fecundidade, sendo o Athame o símbolo do falo (pênis) do Deus dos Bruxos e o cálice representando o útero da Deusa dos bruxos.

Os bruxos gostam de dizer que, por suas práticas serem mais antigas que o cristianismo, a igreja católica romana teria “copiado” o GRANDE RITO, na forma da consagração do pão e do vinho, quando o sacerdote Católico deve inserir a hóstia sagrada no cálice que contém o vinho, representando assim também, a fecundidade, recriando o corpo e o sangue de Cristo.

Como eu disse, essa prática é INICIALMENTE apresentada aos praticantes como uma prática inocente, simbólica, mas no grau definitivo da bruxaria, descobrimos que se trata na verdade de uma operação de magia sexual, e que é praticada verdadeiramente e não mais simbolicamente.
E assim foi comigo.

Já estávamos “vestidos de céu”, que é como os bruxos chamam a prática de realizar seus rituais nus. Segundo Gradner em seus escritos, tal prática favoreceria a circulação das energias em nossos corpos, tão necessárias aos rituais... hoje compreendo que essa prática na verdade se liga diretamente as manobras de magia sexual (e não são poucas) da bruxaria e como uma forma de propiciar a excitação sexual para essas práticas.

Meu renascimento passou por práticas rituais as quais mesmo naquela época alertaram-me quanto ao simbolismo disfarçado em práticas simbólicas que ao galgar os próximos graus, tornavam-se práticas.
Aprendi uma prática chamada de beijo quíntuplo. Nessa parte da cerimônia teria de beijar na ordem, os pés, joelhos, genital, seios e boca de minha iniciadora, formando assim o Pentáculo, a estrela de cinco pontas.

A cada beijo era proferida uma frase como: 

“abençoados sejam teus pés, que te trazem pelo caminho”
“abençoados sejam seus joelhos, que se dobram ao poder dos Deuses”
“Abençoado seja teu sexo, pelo qual se forma toda a vida”
“abençoados sejam seus seis, formados em beleza”
“abençoada seja tua boca, que proferi as palavras sagradas”

Depois do beijo quíntuplo, era hora de aprender a prática ritualística mais forte da bruxaria: Puxar o Sol e a Lua para baixo.

Essas práticas se dão para que, na forma de uma invocação, o Sacerdote passe a representar fisicamente o Deus (Sol) e a Sacerdotisa a Deusa (Lua). Os bruxos fundamentam o fato de que sua magia sexual não seria errada, uma vez que não é praticada pelos sacerdotes, mas sim pelos próprios Deuses.

Por essa prática, os sacerdotes doariam seu corpo para que os Deuses pudessem se manifestar na Terra, de forma física.

Inicialmente levei um grande susto na invocação usada para “puxar o Deus para baixo”, chamada de A CARGA DO DEUS. Ela começava declamando os vários nomes de representações do Deus, e uma delas, ou a principal seria LÚCIFER.

Como eu disse isso me chamou a atenção, afinal sempre ouvi de minha iniciadora que o paganismo era anterior à cultura hebraico-cristã e que eu deveria expurgar qualquer prática ligada às essas doutrinas. Então, o que estaria Lúcifer, o Querubim decaido fazendo naquela invocação?

Mais tarde me foi explicado que Lúcifer seria um dos nomes de Apollo, o Deus grego simbolizado pelo raio de Sol. Daí ser “o portador da Luz”. É evidente que essa explicação me serviu na época, mas que atualmente mostra ser mais uma prova de que o Mal se esconde nas práticas da Bruxaria, ademais de seus membros não saberem disso. Acredito mesmo que Mariah, até hoje ainda acredite em tudo o que me ensinou e as desculpas desmazeladas para encobrir as verdadeiras finalidades da bruxaria.

Realmente ao proferir a Carga do Deus, meu corpo começou a se comportar como se tivesse vontade própria. Eu via tudo, compreendia tudo, mas é como se dividisse meu corpo com outra pessoa. Enquanto isso, Mariah me estimulava para a futura prática do Grande Rito.

Terminadas as preliminares ritualísticas, estando Mariah e eu devidamente empossados do poder e da energia dos Deuses, minha iniciadora se deitou sobre a toalha de pentágono. Pés separados, mas junto às nádegas, pernas semiabertas, mãos segurando o grande cálice apoiado sobre seu ventre. Nesse momento, sem maiores explicações eu realizei o Grande Rito Simbólico, introduzindo a adaga no cálice... e logo após, recebi a transmissão do poder do sacerdote de terceiro grau pelo Grande Rito sexual.

Ao final do ato, minha nudez foi coberta pelo Robe Vinho com a barra carmim.

Finalmente pude compreender as razões dos antigos mitos de que as bruxar fariam sexo com o demônio. Que durante seus Sabbaths (cerimônias), o próprio demônio, com corpo de homem, vestido de preto e com a cabeça de bode faria sexo com as bruxas.

Na verdade esse mito teria nascido da observação de pessoas escondidas para espionar as festas sagradas das bruxas. Como muitos membros da nobreza eram membros da bruxaria, tinha-se a prática de usar uma máscara para esconder a identidade. Essa máscara era uma homenagem ao deus de chifres, representado por um animal de criação ou selvagem, comumente o bode. Como se tratava de um membro da nobreza, lhe era dada a honra de realizar o “grande rito” no lugar do sacerdote local. Resumindo: Um membro da nobreza visitava a celebração, devidamente disfarçado com uma máscara de bode, trajando negro e que fazia sexo com a sacerdotisa, ou seja, com a principal bruxa local. Aos que observavam de longe, facilmente lhes pareceria que o próprio satanás teria vindo a Terra para fazer sexo com uma bruxa.

Agora eu era um Sumo-Sacerdote da Bruxaria.



 Capítulo X
O silêncio dos inocentes

  

Evidentemente que o caminho de volta foi silencioso. Eu estava frontalmente constrangido, apesar de não reconhecer o mesmo sentimento em Mariah. Para mim, tudo era novo. É claro que a cada novo grau aprendia coisas novas, mas apenas nessa última cerimônia essas coisas além de fazerem todo sentido, ainda se tornaram práticas e não mais simbólicas. Além disso, tinha tido pela primeira vez o contato direto com a presença do Deus em meu interior. Uma forma de energia completamente diferente de tudo que já havia sentido.

Mariah aceitou meu convite para subir até meu apartamento. Lá chegando, evidentemente que uma torrente de sentimentos explodiu em mim e, sem mais aguentar, comecei a questionar as razões para o abandono durante o segundo grau.

Mariah começou a me explicar o dualismo presente nesse grau. Que tudo o que eu havia passado era absolutamente previsível, até meu período como Ateu. Mas que eram provações que eu teria de passar sozinho e que, apenas durante esse período eu poderia vivenciar o que seria perder aquilo que já havia conquistado.

Compreendi as razões para a perda dos meus “poderes”. Para a sensação de abandono. Para minha ida ao Mundo e suas distrações... Mas também que, através da minha aceitação quase imediata e incondicional a cerimônia do terceiro grau é que seria resgatado.

Mariah ainda ficou comigo por três meses me instruindo. Copiei todo o final do já conhecido BOS (Livro das Sombras) e aprendi várias cerimônias tradicionais da Bruxaria. Mariah sempre disse que como um Elder (ancião) da tradição, como único membro no Brasil, que deveria continuar esse ramo da tradição no Brasil.

Por incrível que possa parecer, levava a Bruxaria tão seriamente que, apenas mais de 10 anos depois viria a iniciar minha primeira sacerdotisa, e em 28 anos, apenas iniciei seis sacerdotes(isas) nesses 28 anos de prática.

Apenas um sumo sacerdote pode “trazer uma nova vida”. Mais adiante contarei sobre o Templo de Brigith, por onde passaram mais de 2.000 pessoas por meus cursos de bruxaria, o que é muito diferente de serem iniciados.

Dois pontos importantes a serem aqui mencionado são que:
1-     Eu absolutamente me arrependi de cada um dos meus iniciados, e isso enquanto ainda era um bruxo. Todos foram uma grande decepção para mim. Reneguei a todos ao final de minha “carreira” na bruxaria.

2-     Como mencionado anteriormente, apenas um sumo sacerdote pode iniciar alguém na bruxaria. Eu cheguei a iniciar a sacerdotisa que me acompanhava até o segundo grau, mas não mais que isso. Então, com minha conversão ao Cristianismo, a tradição de bruxaria de minha linhagem morreu em nosso país.

O leitor deve poder imaginar a grande decepção que devo estar sendo para os Elders da Bruxaria... em contrapartida, sei que tenho honrado e que sou atualmente um dos justos do Deus Vivo e de seu Filho, Jesus Cristo.


Depois desse período de instrução com Mariah, ela se foi novamente, e dessa vez não mais como minha instrutora, mas apenas como minha iniciadora. Eu vi Mariah mais algumas vezes, mas seu trabalho comigo estava terminado. Começava uma nova fase em minha vida.

Em 2005 realizando Sabbath (Ritual)

Altar para Sabbath do dia dos Mortos

Grande Rito Simbólico

Cerimônia do dia dos Mortos 2011

Uma das representações Antigas do Deus dos Bruxos O Celta Cernnunos

terça-feira, 1 de março de 2016

Capítulos VII - E o Bruxo se torna ateu e VIII O Bruxo renasce




Capítulo VII
E o Bruxo se torna ateu



As cartas de Mariah, que eram frequentes durante meu 1º grau iniciático simplesmente desapareceram. Como de costume, no primeiro mês eu escrevi seis cartas para minha iniciadora, mas não recebi nenhuma resposta.

Começava a ficar preocupado e tentei manter contato telefônico, sem sucesso. Era claro que Mariah me evitava. Eu não compreendi as razões para esse abandono, exatamente num momento em que acabara de ser elevado a um “alto sacerdote” e sendo o único bruxo da tradição em meu País.

A vida continuava, os estudos no ocultismo continuavam, mas meu progresso na bruxaria se estagnara. Comecei a me voltar aos grupos de estudos, que com o tempo também começaram a me entediar. Eu precisava de algo que me fizesse ter novamente aquela curiosidade.

Nessa época eu cursava direito na Pontifícia Universidade Católica do RJ e, como uma forma de revolta, o tema de meu primeiro trabalho no curso chamado “o homem e o fenômeno religioso” foi sobre o satanismo. Essa era uma forma de tripudiar da igreja católica e mais, com tudo o que eu cria. Afinal, como pagão não acreditava no demônio.

Aliás, a maior arma do demônio é fazer com que as pessoas não acreditem nele. Assim ele pode operar com naturalidade, fazendo com que as pessoas acreditem que seus problemas são NATURAIS e, por tanto, não recorrendo à ajuda espiritual de Deus. Não tenho nenhuma dúvida de que, quando alguém diz a famosa frase “o diabo não existe”, o inferno entra em festa!

O demônio não quer ser conhecido, ele quer trabalhar nas trevas. Apesar de o demônio ser o Pai do orgulho, ele quer que os seres humanos não se lembrem dele. Ele tem profundo desprezo pela raça humana e briga por nossas almas com apenas dois objetivos: Trazer tristeza a Deus e ter a quem torturar como companhia em sua prisão eterna, o Inferno.

Aos poucos fui abandonando os grupos de estudos, fui parando com os estudos de ocultismo e não mais fazia experiências de projeção astral. Já faziam mais de quatro meses sem qualquer contato de Mariah, e as coisas não iam mais tão bem.

Minhas noites de sono começaram a ser pequenas. Vivia para trabalhar durante o dia, frequentava a faculdade à noite e depois ia para baladas de segunda a segunda.

Quero que o leitor entenda que esse livro tem a intenção de ilustrar o que passei enquanto servia ao Mal, mesmo que enganado, e não ser uma biografia. Por tanto, acabo suprimindo várias passagens de minha vida, e tenho a certeza de que muitas pessoas com quem tive ligação no passado, ao lerem esse livro estarão agradecidas por isso.

Tinha abandonado completamente tudo que fosse ligado ao oculto ou de cunho religioso. Vivia meus dias pelo e para o prazer. Fumava como uma chaminé. Não bebia... isso foi algo que o demônio nunca conseguiu colocar dentro de mim. Sempre odiei o gosto da bebida alcoólica, e sempre gostei de manter minha consciência intacta. É claro que socialmente eu mantinha uma garrafa de Whisky num restaurante chamado Mostarda no bairro do Leblon, mas unicamente porque era uma forma de status, e isso impressionava as mulheres.

Nesse período recebi meu primeiro revés, o que acabou me afastando e me revoltando contra a religião. Certo dia, chegando da rua por volta das 3:00 da manhã, fui direto para a cama. Acordei meia hora depois, com uma dor pavorosa no estômago, dor que nunca tinha sentido antes.

Que me lembre, desde a infância JAMAIS tive qualquer doença, salvo uma faringite na primeira infância, uma catapora antes dos dez anos e, curiosamente, “quebrei” a cabeça (levei pontos) por oito vezes. Mas nunca tinha fraturado nenhum osso, não tinha doenças, até os comuns resfriados não aconteciam comigo. Eu sempre acreditei que isso se devia graças aos meus estudos no ocultismo e minhas práticas de bioenergética. E até poderia ser, uma vez que tudo aconteceu exatamente quando abandonei essas práticas.

A dor era enlouquecedora, me retorcia na cama, sem sequer conseguir me levantar para ir até o telefone. Naquela madrugada eu realmente achei que iria morrer, e nesse momento clamei aos meus Deuses. Nenhuma resposta. Tentei manipular energia, aquela mesma energia que me dava o poder para desmaiar pessoas e de fazer com que os afetados por minha magia, vissem característica muito melhores em mim, do que as que eu tinha realmente. Nenhum resultado!

Na minha dor, amaldiçoei esses Deuses, desacreditei, me achei um verdadeiro imbecil por ter me dedicado ao longo do último ano a esses Deuses.

Eu ouvia meu telefone na mesa de cabeceira tocar sem parar pela manhã, mas sem forças e sem condições de me levantar para chegar até ele. Era minha mãe tentando contato... e essa foi minha sorte.

Como morava sozinho, existiam duas pessoas que tinham a chave de minha casa. Uma “secretária” que trabalhava com a família desde antes de meu nascimento, e que me visitava duas vezes por semana para faxina na casa, lavar roupas e a outra era a minha mãe.

Preocupada por não atender ao telefone, minha mãe resolveu ir até a minha casa. E foi a minha sorte... Ao entrar ela viu a situação desesperadora. Eu quase sem forças sequer para me contorcer de dor, quanto mais para falar. Em pânico ela chamou uma ambulância e fui removido para o hospital.

O mais incrível é que, ao entrar na ambulância, a dor foi diminuindo pouco a pouco, e ao chegar ao hospital, ela já não existia. Passei por uma bateria de exames e foi diagnosticada uma leve gastrite, mas eu tinha a certeza de que não era nada leve, eu tinha sentido uma dor como nunca antes sentira. Essa gastrite me acompanhou dos 18 anos aos 40 de idade.

Mas com a dor que desapareceu, também desapareceu todo o “poder” que acreditava ter. Não era mais capaz de ver passado e futuro. Não conseguia mais manipular energia e desdobrar durante o sono. Tudo aquilo que eu tinha abandonado voluntariamente pelos prazeres de uma vida mundana também tinham me abandonado, assim como minha iniciadora também tinha desaparecido. Percebi então que, naquela noite eu teria perdido todos os meus “poderes”.

Foi nessa época em que desacreditei de tudo, dos Deuses, do espírito, da energia, dos estudos... de tudo que não fosse material.

Foi então que me vi como um ateu!







Capítulo VIII
O Bruxo renasce

  
É impressionante como o ser humano tem a capacidade de excluir de suas vidas aquilo que não mais o interessa. Naquele momento de minha vida, excluí absolutamente tudo que fizesse referência à espiritualidade.

Os últimos dois anos tinham sido completamente voltados ao meu desenvolvimento no sacerdócio e no ocultismo, mas agora tudo tinha ficado no passado, como se fosse vida de outra pessoa, completamente diferente do que era agora. No meio esotérico, diz-se que: “O Universo conspira a favor do que se acredita e deseja”. Naquele momento de minha vida, contagiado pela revolta por perder meus “poderes” e pelo abandono de minha mentora espiritual, simplesmente apaguei esse tempo de minha história.

Apesar de todas as experiências sobrenaturais, de tudo que havia vivenciado todas essas “maravilhas”, agora me soavam no máximo como grandes coincidências. Eu racionalizava absolutamente tudo. Eu ria das pobres criaturas que acreditavam em qualquer referência ao ocultismo e religião.

A vida seguia. Trabalho, festas, amizades. Foi então que, numa noite se sexta-feira, chegando a minha casa, minha vida voltou a se transformar.

Saindo do elevador, encontrei no Hall de meu apartamento uma caixa na porta de meu apartamento. A caixa era muito bonita, recoberta de um papel aveludado de cor carmim e com tiras de tecido dourado lacrando o “presente”. Na tampa um símbolo de um Pentáculo com um triângulo sobre a ponta superior.

Eu conhecia o símbolo. A marca do sacerdote de primeiro grau era o conhecido Pentáculo. A estrela de cinco pontas que representava ao mesmo tempo, o homem e os cinco elementos: Terra, Ar, Fogo, Água e o Espírito. A ponta do Pentáculo voltada para cima representava a cabeça humana volta aos céus, em busca da espiritualidade. Já o símbolo do segundo grau, como expliquei anteriormente, era o mesmo Pentáculo com a ponta que representa a cabeça humana voltada para baixo. Mas aquela nova marca era o símbolo do terceiro grau, o grau máximo, o sumo-sacerdócio.



Peguei o pacote e entrei em casa. Coloquei-o em cima de minha cama e sei que o leitor pode se perguntar por que não o abri imediatamente. A resposta é simples: naquele momento eu me questionava por que um pacote selado com o símbolo do terceiro grau estaria na minha porta? Tanto tempo sem qualquer notícia de minha iniciadora e, exatamente no momento de minha vida em que duvidava de tudo e de todos, meu passado literalmente voltava a minha porta.

Não sabia o que encontraria dentro daquela caixa. Seria uma ameaça? Apesar de abandonar (ou ter sido abandonado) tudo, eu jamais tinha desonrado os pactos de silêncio firmados nas duas iniciações no sacerdócio. O que os Elders (anciões) da bruxaria poderiam querer comigo ou de mim?

Tomei um demorado banho. Em minha mente giravam perguntas sem resposta. Eu sabia que, independente do que pudesse tentar antecipar, só saberia da verdade ao abrir o pacote. Secava meu corpo olhando para aquela caixa que representava um passado recente, mas que eu não sabia se queria novamente trazer a tona.

Duas das principais lições que tinha aprendido no ocultismo eram que, medo era prenúncio de fracasso e que a curiosidade não tinha espaço para o iniciado.

Com calma, controlando minha ansiedade, comecei a abrir aquela caixa. Abri com o cuidado daquelas vovós que ao abrirem um presente, procuram não rasgar nada para guardar o papel de presente para uma futura ocasião especial. Soltei as fitas douradas, movimentei a tampa com cuidado e abri a caixa.

Dentro existia um bilhete escrito em pergaminho e com o selo em cera que já conhecia e identifiquei imediatamente. Era o selo de Mariah. Também havia um robe de cor vinho em veludo, com a barra mais escura, mas também de um vinho mais escuto do que o restante da veste.

No bilhete podia ler as poucas palavras escritas em inglês: “Be ready on Sunday at 08:00 pm .
Now is the time for your return and to reborn again.”

Esteja pronto no domingo às 20:00 .Agora é o momento para o seu retorno e de renascer novamente.”

Sim, era meu passado retornando de forma tão enigmática quanto havia desaparecido.

Minha primeira reação foi de raiva. Quem Mariah pensava ser? Havia desaparecido e me abandonado no momento que se mostrou o mais difícil de minha vida e agora voltava sem explicações querendo que eu simplesmente a obedecesse, como se nada houvesse acontecido?

Ainda mais, eu tinha perdido todas as minhas capacidades. Como eu poderia retomar um caminho que eu havia abandonado voluntariamente? Como ela poderia imaginar que eu estivesse pronto para o derradeiro degrau da bruxaria, se não sabia o que eu tinha passado no último ano?

O que eu não podia imaginar é que ela sabia de TUDO!