Capítulo IX A Mulher Altar e o Grande Rito
Durante todo aquele sábado as perguntas e a dúvida não saiam de minha mente. Não tinha conseguido fechar os olhos e dormir nem um minuto. Não sabia por que do abandono e agora do retorno de Mariah. Não sabia como tinha perdido minhas habilidades e nem se voltaria a tê-las, aliás, se queria tê-las. Não sabia mais o que era verdade ou imaginação. Acho que foi o pior sábado de toda a minha vida.
Alex
Sanders (Criador da tradição Alexandrina) iniciando nova bruxa. Ao fundo Maxim
Sanders, sua esposa e sacerdotisa
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Durante todo aquele sábado as perguntas e a dúvida não saiam de minha mente. Não tinha conseguido fechar os olhos e dormir nem um minuto. Não sabia por que do abandono e agora do retorno de Mariah. Não sabia como tinha perdido minhas habilidades e nem se voltaria a tê-las, aliás, se queria tê-las. Não sabia mais o que era verdade ou imaginação. Acho que foi o pior sábado de toda a minha vida.
Era agora um jovem de 19 anos de
idade, que já tinha passado por muita coisa. Muitas experiências dos mundos
físico e espiritual, mas mesmo assim, aquele novo desafio me era desconhecido.
É claro que sentimentos muito
negativos rondavam minha mente. Mágoa, raiva, dúvida... mas ao mesmo tempo eu
só podia “arranhar” o que seria me tornar um sumo-sacerdote. Quais as responsabilidades
que viriam com isso? Quais as habilidades? No que minha vida se transformaria?
Ainda hoje eu acredito que as
dúvidas e as possibilidades que envolviam a decisão, é que me levaram a
realmente aceitar aquele convite. E a partir da minha decisão em aceita-lo é
que a ansiedade cresceu sem limites. Alguns anos mais tarde eu aprenderia que
deveria fazer o que desejasse, sem ânsia de resultados, ou seja, a ansiedade
era um “câncer” para o magicista.
A noite de sábado para o domingo
não foi nada diferente. Nem um minuto de sono. A essa altura o corpo dava
sinais de esgotamento, mas por mais que tentasse, não conseguia relaxar. Ver
Mariah de novo após seu longo silencio fazia com que minha mente se tornasse
uma usina de sentimentos desconexos. Eu sentia muita raiva do abandono e mesmo
das experiências degradantes e dolorosas como do ataque de gastrite, mas ao
mesmo tempo, sentia falta do apoio, amor e instruções de Mariah.
Não vou negar ao leitor que o Mal
é sedutor. Mesmo não me dando conta de que esse Mal era meu senhor (não custa
lembrar ao leitor que sempre acreditei estar ao lado do Bem) eu me encantava
com as capacidades que ser um sacerdote me proporcionavam. Sentia muita falta
dos “poderes”, de poder manipular e influenciar pessoas ao meu bel prazer. Só
isso já deveria ter me servido como alerta sobre o Mal naquela época. Mas eu
era jovem e, apesar do grande conhecimento e experiência de vida com apenas 19
anos de idade, a imaturidade da jovialidade me era comum.
Acho que apenas a adrenalina que
aumentava a cada hora passada, o aproximar da hora marcada é que me mantinha
acordado.
Evidentemente que comecei a me
aprontar para o encontro com bastante antecedência. Perdi a conta de quantas
vezes experimentei aquele Robe, aquela veste que sabia ser a veste do
Sacerdócio Mor. Tentei me alimentar, mas apesar do estômago vazio não dar
sinais da já companheira gastrite, não conseguia me alimentar.
Quando ainda faltavam mais de
quarenta minutos, não aguentei e desci para a portaria, esperando pela chegada
de Mariah, como já havia feito por outras duas vezes antes.
Ela chegou para me buscar, parou
a frente do meu prédio e fez um sinal com a cabeça para que eu entrasse no
carro. E assim eu o fiz.
Minha vontade era de sacudi-la
pelos ombros, gritar e questionar por satisfações. Um sorriso de Mariah me
desarmou completamente:
-Olá querido. Não pergunte nada,
não questione nada. Ao final dessa noite você terá todas as respostas. – Ela me
disse sorrindo.
No entanto, aquela falta de
satisfação me bastou. De certa forma eu queria perdoar. Eu queria compreender e
não queria mesmo perder aquele vínculo de amor que tinha montado com minha
iniciadora. Meus sentimentos por ela eram um misto de amor de filho, misturado
com admiração, mas é claro que apesar da pouca diferença de idade (Mariah era
apenas alguns anos mais velha), também existia um sentimento diferente, uma
tensão quase sexual entre nós.
Desta vez eu não fui vendado. Não
existiriam mais segredos para mim, afinal, era hora de me tornar o suprassumo,
o ápice do que se pode chegar na bruxaria.
Pela primeira vez soube ao certo
onde eu era levado nas minhas iniciações e em que local as passagens mais
fortes de minha vida tinham se dado.
Mariah estacionou o carro em
frente ao portão de madeira que nos daria entrada a casa que me referi por anos
como “a casa verde”, simplesmente, pois era toda verde. Portas, Janelas,
paredes, grades, enfim, não existia outra cor naquela casa.
Fomos até a mesma área
ritualística na qual tinha vivenciado as duas iniciações anteriores. Lá estavam
o Altar montado, os quadrantes indicados, o círculo traçado no chão de terra.
No meio do círculo encontrava-se
uma toalha negra com um grande pentagrama dourado pintado em seu centro. Aquilo
me chamou atenção, pois em nenhuma das duas cerimônias anteriores essa toalha
podia ser visível. Reparei também que em um canto, num mini altar colocado a
nordeste, um crânio repousava junto a fotos de ancestrais que reconheci
imediatamente (muitas daquelas mesmas fotos me haviam sido presenteadas por
Mariah desde minha primeira iniciação). O crânio tinha diversas fitas coloridas
presas a ele por pingos de velas, e mais tarde vim, a saber, que aquela era a
representação do guardião espiritual de nossa tradição.
Sobre o altar principal estavam o
chicote (usado na minha primeira iniciação como símbolo de purificação), o
Athame, mas algo me chamou imediatamente a atenção: Um Cálice muito maior que o
comum.
Existe uma parte da cerimônia da
Bruxaria chamada de “O GRANDE RITO”.
Inicialmente esse grande rito se
apresenta aos praticantes como uma prática simbólica, onde o Athame (adaga
ritualística) e inserido no cálice em determinada hora da celebração. Esse ato
seria o simbolismo da fecundidade, sendo o Athame o símbolo do falo (pênis) do
Deus dos Bruxos e o cálice representando o útero da Deusa dos bruxos.
Os bruxos gostam de dizer que,
por suas práticas serem mais antigas que o cristianismo, a igreja católica
romana teria “copiado” o GRANDE RITO, na forma da consagração do pão e do
vinho, quando o sacerdote Católico deve inserir a hóstia sagrada no cálice que
contém o vinho, representando assim também, a fecundidade, recriando o corpo e
o sangue de Cristo.
Como eu disse, essa prática é
INICIALMENTE apresentada aos praticantes como uma prática inocente, simbólica,
mas no grau definitivo da bruxaria, descobrimos que se trata na verdade de uma
operação de magia sexual, e que é praticada verdadeiramente e não mais
simbolicamente.
E assim foi comigo.
Já estávamos “vestidos de céu”,
que é como os bruxos chamam a prática de realizar seus rituais nus. Segundo
Gradner em seus escritos, tal prática favoreceria a circulação das energias em
nossos corpos, tão necessárias aos rituais... hoje compreendo que essa prática
na verdade se liga diretamente as manobras de magia sexual (e não são poucas)
da bruxaria e como uma forma de propiciar a excitação sexual para essas
práticas.
Meu renascimento passou por
práticas rituais as quais mesmo naquela época alertaram-me quanto ao simbolismo
disfarçado em práticas simbólicas que ao galgar os próximos graus, tornavam-se
práticas.
Aprendi uma prática chamada de
beijo quíntuplo. Nessa parte da cerimônia teria de beijar na ordem, os pés,
joelhos, genital, seios e boca de minha iniciadora, formando assim o Pentáculo,
a estrela de cinco pontas.
A cada beijo era proferida uma
frase como:
“abençoados sejam teus pés, que te trazem pelo caminho”
“abençoados sejam seus joelhos,
que se dobram ao poder dos Deuses”
“Abençoado seja teu sexo, pelo
qual se forma toda a vida”
“abençoados sejam seus seis,
formados em beleza”
“abençoada seja tua boca, que
proferi as palavras sagradas”
Depois do beijo quíntuplo, era
hora de aprender a prática ritualística mais forte da bruxaria: Puxar o Sol e a
Lua para baixo.
Essas práticas se dão para que,
na forma de uma invocação, o Sacerdote passe a representar fisicamente o Deus
(Sol) e a Sacerdotisa a Deusa (Lua). Os bruxos fundamentam o fato de que sua
magia sexual não seria errada, uma vez que não é praticada pelos sacerdotes,
mas sim pelos próprios Deuses.
Por essa prática, os sacerdotes
doariam seu corpo para que os Deuses pudessem se manifestar na Terra, de forma
física.
Inicialmente levei um grande
susto na invocação usada para “puxar o Deus para baixo”, chamada de A CARGA DO
DEUS. Ela começava declamando os vários nomes de representações do Deus, e uma
delas, ou a principal seria LÚCIFER.
Como eu disse isso me chamou a
atenção, afinal sempre ouvi de minha iniciadora que o paganismo era anterior à
cultura hebraico-cristã e que eu deveria expurgar qualquer prática ligada às essas
doutrinas. Então, o que estaria Lúcifer, o Querubim decaido fazendo naquela
invocação?
Mais tarde me foi explicado que
Lúcifer seria um dos nomes de Apollo, o Deus grego simbolizado pelo raio de
Sol. Daí ser “o portador da Luz”. É evidente que essa explicação me serviu na
época, mas que atualmente mostra ser mais uma prova de que o Mal se esconde nas
práticas da Bruxaria, ademais de seus membros não saberem disso. Acredito mesmo
que Mariah, até hoje ainda acredite em tudo o que me ensinou e as desculpas
desmazeladas para encobrir as verdadeiras finalidades da bruxaria.
Realmente ao proferir a Carga do
Deus, meu corpo começou a se comportar como se tivesse vontade própria. Eu via
tudo, compreendia tudo, mas é como se dividisse meu corpo com outra pessoa.
Enquanto isso, Mariah me estimulava para a futura prática do Grande Rito.
Terminadas as preliminares
ritualísticas, estando Mariah e eu devidamente empossados do poder e da energia
dos Deuses, minha iniciadora se deitou sobre a toalha de pentágono. Pés separados,
mas junto às nádegas, pernas semiabertas, mãos segurando o grande cálice
apoiado sobre seu ventre. Nesse momento, sem maiores explicações eu realizei o
Grande Rito Simbólico, introduzindo a adaga no cálice... e logo após, recebi a
transmissão do poder do sacerdote de terceiro grau pelo Grande Rito sexual.
Ao final do ato, minha nudez foi
coberta pelo Robe Vinho com a barra carmim.
Finalmente pude compreender as
razões dos antigos mitos de que as bruxar fariam sexo com o demônio. Que
durante seus Sabbaths (cerimônias), o próprio demônio, com corpo de homem,
vestido de preto e com a cabeça de bode faria sexo com as bruxas.
Na verdade esse mito teria
nascido da observação de pessoas escondidas para espionar as festas sagradas
das bruxas. Como muitos membros da nobreza eram membros da bruxaria, tinha-se a
prática de usar uma máscara para esconder a identidade. Essa máscara era uma
homenagem ao deus de chifres, representado por um animal de criação ou
selvagem, comumente o bode. Como se tratava de um membro da nobreza, lhe era
dada a honra de realizar o “grande rito” no lugar do sacerdote local.
Resumindo: Um membro da nobreza visitava a celebração, devidamente disfarçado
com uma máscara de bode, trajando negro e que fazia sexo com a sacerdotisa, ou
seja, com a principal bruxa local. Aos que observavam de longe, facilmente lhes
pareceria que o próprio satanás teria vindo a Terra para fazer sexo com uma
bruxa.
Agora eu era um Sumo-Sacerdote da
Bruxaria.
Capítulo
X
O
silêncio dos inocentes
Evidentemente que o caminho de
volta foi silencioso. Eu estava frontalmente constrangido, apesar de não
reconhecer o mesmo sentimento em Mariah. Para mim, tudo era novo. É claro que a
cada novo grau aprendia coisas novas, mas apenas nessa última cerimônia essas
coisas além de fazerem todo sentido, ainda se tornaram práticas e não mais
simbólicas. Além disso, tinha tido pela primeira vez o contato direto com a
presença do Deus em meu interior. Uma forma de energia completamente diferente
de tudo que já havia sentido.
Mariah aceitou meu convite para
subir até meu apartamento. Lá chegando, evidentemente que uma torrente de
sentimentos explodiu em mim e, sem mais aguentar, comecei a questionar as
razões para o abandono durante o segundo grau.
Mariah começou a me explicar o
dualismo presente nesse grau. Que tudo o que eu havia passado era absolutamente
previsível, até meu período como Ateu. Mas que eram provações que eu teria de
passar sozinho e que, apenas durante esse período eu poderia vivenciar o que
seria perder aquilo que já havia conquistado.
Compreendi as razões para a perda
dos meus “poderes”. Para a sensação de abandono. Para minha ida ao Mundo e suas
distrações... Mas também que, através da minha aceitação quase imediata e
incondicional a cerimônia do terceiro grau é que seria resgatado.
Mariah ainda ficou comigo por
três meses me instruindo. Copiei todo o final do já conhecido BOS (Livro das
Sombras) e aprendi várias cerimônias tradicionais da Bruxaria. Mariah sempre
disse que como um Elder (ancião) da tradição, como único membro no Brasil, que
deveria continuar esse ramo da tradição no Brasil.
Por incrível que possa parecer,
levava a Bruxaria tão seriamente que, apenas mais de 10 anos depois viria a
iniciar minha primeira sacerdotisa, e em 28 anos, apenas iniciei seis
sacerdotes(isas) nesses 28 anos de prática.
Apenas um sumo sacerdote pode
“trazer uma nova vida”. Mais adiante contarei sobre o Templo de Brigith, por
onde passaram mais de 2.000 pessoas por meus cursos de bruxaria, o que é muito
diferente de serem iniciados.
Dois pontos importantes a serem
aqui mencionado são que:
1-
Eu
absolutamente me arrependi de cada um dos meus iniciados, e isso enquanto ainda
era um bruxo. Todos foram uma grande decepção para mim. Reneguei a todos ao
final de minha “carreira” na bruxaria.
2-
Como
mencionado anteriormente, apenas um sumo sacerdote pode iniciar alguém na
bruxaria. Eu cheguei a iniciar a sacerdotisa que me acompanhava até o segundo
grau, mas não mais que isso. Então, com minha conversão ao Cristianismo, a tradição
de bruxaria de minha linhagem morreu em nosso país.
O leitor deve poder imaginar a
grande decepção que devo estar sendo para os Elders da Bruxaria... em
contrapartida, sei que tenho honrado e que sou atualmente um dos justos do Deus
Vivo e de seu Filho, Jesus Cristo.
Depois desse período de instrução
com Mariah, ela se foi novamente, e dessa vez não mais como minha instrutora,
mas apenas como minha iniciadora. Eu vi Mariah mais algumas vezes, mas seu
trabalho comigo estava terminado. Começava uma nova fase em minha vida.
Em 2005 realizando Sabbath (Ritual)
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Altar para Sabbath do dia dos Mortos
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Grande Rito Simbólico
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Cerimônia do dia dos Mortos 2011
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Uma das representações Antigas do Deus dos Bruxos O Celta
Cernnunos
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