Capítulo
XI
E
a vida continua
Agora eu era um Sumo Sacerdote da bruxaria. Aos poucos minhas
capacidades voltavam. Talvez não tão fortes como antes, mas sem dúvida mais
amadurecidas. A visão se ampliava no uso de práticas divinatórias (Tarot,
Runas, etc), minha “aestesis” (sensibilidade às energias) crescia dia a dia.
Os estudos em ocultismo prosseguiam e alguns anos se passaram
e eu cheguei aos 25 anos. Era o ano de 1994 e foi nessa época que me casei pela
primeira vez. Já não trabalhava mais no antigo emprego. Já tinha sido dono de
uma distribuidora de produtos descartáveis e atualmente trabalhava como Gerente
de Produção do maior grupo segurador da América Latina, vinculada ao maior
Banco Privado do Brasil.
A vida de baladas e festas já tinha acabado. Agora eu já
tinha um filho, era um Pai e não mais fazia os encontros para manipulação e
estudo de energias. Minhas práticas religiosas continuavam de forma discreta.
Mas o ocultismo voltava a me perseguir.
Eu trabalhava no Centro da cidade do Rio de Janeiro, na Praça
Pio X, próximo a Candelária. Chefiava um grupo de mais de 30 pessoas e era
extremamente atarefado. Numa tarde, fui abordado por um senhor, que aparentava
ter uns setenta anos de idade.
Esse senhor viria a ser a mola mestra de minha entrada na
Maçonaria.
Eu sempre tive uma grande curiosidade sobre a maçonaria. Tive
pouco contato com meu Pai biológico que, separou-se de minha mãe quando eu
tinha apenas dois anos de idade. Eventualmente o via nas férias escolares
durante minha infância e adolescência, e nesses raros períodos em que passava
com meu pai, sempre o vi profundamente envolvido na maçonaria, fosse
diretamente nas reuniões de sua Loja maçônica, fosse pelas amizades (maçons em
sua maioria) e nas histórias que me contava.
Apesar de aos 25 anos de idade já ser um mestre do ocultismo
e um sumo sacerdote da bruxaria, pouco sabia sobre a maçonaria. Apenas as
referências a outros ocultistas que teriam sido maçons (Gardner, Eliphas Levy,
etc) e poucas “filosofagens” que encontramos em livros.
Por mais que tenhamos atualmente a internet, livros, mais
informação... apenas um verdadeiro maçom pode falar, ou compreender o que é a
maçonaria. E como eu não era um maçom, pouco conhecia sobre a doutrina. Mal
sabia eu que muito em breve eu conheceria e mais, os acontecimentos me levariam
a também ser um maçom diferenciado, dentre todos os que eu chamava de irmãos.
Como eu comentei, numa tarde de 1994 fui procurado por um
senhor em desespero. Ele me explicava que, há seis anos atrás ele teria
atropelado uma pessoa, mas que a seguradora teria pago absolutamente todas as indenizações
necessárias a vítima. O problema é que a seguradora teria sido comprada por
nosso Banco, e agora ele precisava da documentação que comprovava as
indenizações, já que a vítima teria movido um processo contra ele na justiça.
O senhor estava completamente desesperado. O único bem que
possuía era uma casa, e se não pudesse comprovar os pagamentos a vítima,
certamente teria sérios prejuízos. E o pior... ninguém se prestava a ajuda-lo,
visto que essa ajuda implicaria e ter de buscar em arquivos físicos e
empoeirados da matriz da seguradora todo esse processo de indenização.
Eu não canso de repetir, não como forma de desculpa, mas
apenas para que o leitor perceba como o Mal pode usar alguém que tenha bom
coração... eu era uma pessoa de bom coração! E sendo assim, me comprometi em
ajudar a esse senhor.
Resumindo: Convoquei três dos meus assistentes e procuramos
por dois dias nos arquivos de nossa matriz. Encontramos a documentação e a
levei ao departamento jurídico da seguradora que, imediatamente manteve contato
com o defensor daquele senhor e juntos prepararam a defesa, comprovando os
pagamentos do passado.
Dois meses se passaram, e eu sequer me recordava daquele
simpático senhor (que chamarei de Álvaro daqui para frente), quando mais uma
vez nos reencontramos. Estava em minha mesa quando Álvaro chegou. Cumprimentou-me
com um forte abraço, sentou-se e sem muitos rodeios falou:
- Meu amigo, você foi o único que me ajudou. Eu ganhei o
processo, não terei de pagar mais nada. Só tenho a agradecê-lo! Você já ouviu
falar na maçonaria?
Naquele momento senti dentro de mim uma revolução. Meus
ouvidos zumbiam minha mente, tal qual um computador, começou a vasculhar tudo o
que eu sabia teoricamente sobre maçonaria. Um zumbido alto nos meus ouvidos,
conhecido das práticas de manipulação de energia mostrava que meu sistema
estava alterado.
Procurei me controlar ao máximo e não demonstrar qualquer
tipo de excitação. Respondi simplesmente que já tinha ouvido falar, e que meu
Pai seria um membro, mas que eu mesmo não tinha muito contato com meu Pai.
Álvaro abriu um largo sorriso, o que me tranquilizou
momentaneamente. Imediatamente me explicou que por meu Pai ser maçom, eu seria
seu sobrinho, já que todo maçom é um irmão. Falamos algumas amenidades sobre
esse assunto, quando finalmente veio à pergunta:
-E você gostaria de se tornar um maçom? – perguntou Álvaro.
Ainda sem demonstrar excitação, desejando gritar um SIM
estrondoso, respondi calmamente:
-Pode ser. O que preciso fazer?
Álvaro então me explicou os primeiros passos. Informou-me que
ele era um Pastor Evangélico aposentado e que ele mesmo estava afastado da
maçonaria por razões pessoais. Mas que era um membro de uma Loja (que mais
tarde eu viria a descobrir ser uma das mais tradicionais e fechadas do Brasil)
e que traria para conversar comigo um de seus “afilhados”, ou seja, um dos
membros que ele teria levado a se tornar maçom, e que esse membro me faria o
convite formal.
Nos despedimos, trocamos contatos e ficamos marcados para que,
na semana seguinte eu fosse visitado por ele e seu afilhado. E assim foi.
Capítulo
XII
Pedreiro
Livre
Nunca uma semana demorou tanto a
passar. Finalmente chegara o dia de meu novo encontro com Álvaro e seu
afilhado. Tínhamos marcado no meu trabalho, mas sem marcar hora certa.
Evidentemente que minha gastrite gritava alto. Eu ainda lutava para controlar
minha ansiedade, afinal o próprio Eliphas Levy dizia em seu Dogma e Ritual de
Alta Magia: “O Perfeito Iniciado é o que controla suas paixões”... e eu
tentava.
Só consegui me acalmar quando vi
Álvaro saindo do elevador em direção a minha sala. De onde sentava eu tinha uma
boa visão dos elevadores e naquela manhã ninguém olhou mais para aquele ponto
do prédio que eu.
Álvaro estava acompanhado de
outro senhor, tão idoso quanto ele, o que me pareceu engraçado, visto ser seu
“afilhado”. Depois eu compreenderia que o convite para a maçonaria não
implicaria em idade, e que até um jovem poderia convidar alguém idoso.
Álvaro se aproximou de minha mesa
com um sorriso. Levantei-me e trocamos um apertado abraço. Ele estava visivelmente
feliz e talvez orgulhoso, não só por estar me apresentando a seu afilhado, como
também por acreditar estar trazendo uma boa aquisição para maçonaria, e isso
foi dito por ele mesmo durante nossa conversa.
Foi assim que conheci R.
(chamarei assim), que viria a ser meu Padrinho na Arte dos pedreiros Livres
(tradução do inglês Free Mason). R. era um senhor muito educado. Quis saber de
minha vida, minha família, do que eu conhecia de maçonaria (ao que respondi da
mesma forma de antes) de meu trabalho, etc.
Após uma conversa que durou quase
uma hora, R. retirou alguns documentos de sua bolsa. Era o kit de propostas do
Grande Oriente do Brasil, o que eu viria a descobrir mais tarde, ser a potência
maçônica mais antiga do Brasil, derivando das épocas do Império, e da qual D.
Pedro I fez parte, juntamente com outras diversas figuras políticas da época.
Alguns pontos de nossa conversa
me chamaram atenção. Para ser proposto à maçonaria (ou seja, não para entrar,
mas apenas para ser proposto) eu teria de retirar uma série de documentos de
cartórios que demonstrassem que me tratava de pessoa ilibada civil e
criminalmente. Que ainda receberia três visitas de “sindicantes” que inclusive
conversariam sem meu conhecimento com colegas de trabalho. A essa altura eu já
me sentia espionado. E por último, que minha esposa seria questionada, pois se
ela não fosse favorável, o processo findaria naquele momento.
Apenas após todo esse processo é
que meu nome seria votado e que poderia ser iniciado.
Depois de iniciado eu tive
conhecimento do processo “seletivo” da maçonaria. Após a entrega das fichas que
vem no Kit de proposta, minhas informações pessoais e foto ficaram expostas na
sede da Maçonaria do Grande Oriente do Rio de Janeiro, na Rua do Lavradio,
possibilitando a que qualquer maçom que me reconhecesse e fosse contra a minha
entrada na maçonaria, pudesse se manifestar. Só daí receberia a visita dos três
sindicantes que realmente tinham de espionar minha vida, entrevistar amigos,
parentes, colegas de trabalho... e por último a visita a minha casa, para a
conversa com minha esposa.
Depois dessa burocracia, meu
Padrinho R. teria de me apresentar documentalmente em loja, numa sessão regular
e, durante essa sessão os três sindicantes dariam sua opinião. Só então haveria
a votação de todos os membros da Loja, através do sistema de bolinhas brancas e
pretas... e apenas se todas as bolas fossem brancas é que seria aceito como um
neófito (neo= novo, fitos= planta), ou seja, como um candidato a iniciação.
Álvaro e R. de despediram e
desapareceram no elevador.
Curiosamente nunca mais encontrei
ou soube de Álvaro novamente.
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