Capítulo
XVII
A
casa dos Bruxos
Início de 2002 encontrei um
sobrado em Botafogo. Um segundo andar com área livre, que eu poderia construir
como desejava. Assim nasceu o primeiro Templo de Brigith. Localizado no sobrado
verde da Rua Conde de Irajá.
Frente do Templo de Brigith |
O sucesso foi imediato. Oferecíamos o que ninguém nunca tinha oferecido. A possibilidade REAL de contato com a bruxaria e com o ocultismo. Tínhamos uma loja com produtos que ninguém tinha.
Mariah me ajudava. Enviava
publicações, filmes e produtos que ninguém no Brasil sequer conhecia. Tínhamos
raiz de Mandrágora verdadeira, pingentes importados, athames (adagas) feitos
ritualisticamente.
Os cursos eram diversos, tendo
como carro chefe o de bruxaria que eu ministrava em vários dias e
vários
horários. A grande promessa era de que os membros do curso seriam convidados
para participarem de nossas oito festas anuais e teriam contato efetivo com a
energia da bruxaria. Depois, o praticante poderia escolher a grade para a
continuidade de seu desenvolvimento, que passava por Tarot, Cristais, Ervas,
Radiestesia, Defesa Psíquica, Magia Elemental, e tantas outras práticas ligadas
ao ocultismo. Chegamos a ter em nossa grade mais de 20 cursos funcionando
simultaneamente, inclusive os de mitologia, que eram ministrados por
professores pós-graduados e autores de livros de história. Eu não estava para
brincadeiras. Se minha missão era de apresentar o ocultismo, que fosse de forma
séria e profissional!
Vitrine Livraria Siciliano |
Logo as mazelas de uma
espiritualidade desequilibrada e de “adeptos” cheios de ego, rancor e ciúmes
destruiu o primeiro grupo do Água da Lua. Aqueles mesmos que começaram na
corretora da Ilha do Governador se achavam prontos, se achavam soberanos e
desprezavam os novos membros. O mais engraçado é que assim foi pelos outros
doze anos... sempre um grupo sobrepondo-se ao outro. Os que eram oprimidos
passando a oprimir os que vinham abaixo. Um ciclo de repetições.
Capa de meu Primeiro Livro |
Ficamos por dois anos na Rua
Conde de Irajá, quando o templo ficou pequeno. Precisávamos de mais espaço. A
essa altura tínhamos cursos de Dança do Ventre, Aikido, outras danças e
artesanato pagão.
Foi nessa época que lancei meu
primeiro Livro, também uma direção recebida de Mariah:
“Wicca, a Bruxaria Saindo das
Sombras” e o sucesso foi imediato. O Lançamento aconteceu na Livraria Siciliano
no Barra Shopping e na época foi um sucesso de Vendas.
Fui à busca de novo endereço. Encontrei
o local perfeito! Um casarão na Rua Real Grandeza com três andares e ampla
área. Foi nesse ano de 2004 que nos mudamos para o que seria definitivamente o
Maior Centro de Estudos de Ocultismo do Brasil.
O
espaço era tanto que propusemos a uma aluna que nos fornecia artigos de prata
importados que fizesse seu atelier chamado ARGENTUM na estrutura, e propusemos a
criação de um restaurante temático a sacerdotisa que trabalhava comigo, que,
aliás, foi minha primeira iniciada. Talvez numa nova obra eu escreva sobre aqueles
que iniciei e toda a minha decepção com os mesmo... mas não é a intenção do
atual livro.
Evidentemente
que na última hora acabei assumindo a responsabilidade de toda a estrutura, e
com isso também nasceu a Taberna Greenman, nosso restaurante temático, com
pratos inspirados no Paganismo Irlandês.
Um
pouco antes da mudança para o novo Templo de Brigith, dois acontecimentos
viriam a marcar minha vida: Eliane começaria a trabalhar com os Espíritos e eu
viria a conhecer meu instrutor na ASTRVM ARGENTVM de Aleister Crowley.
Lançamento de meu Livro na Bienal Rio Centro |
Lançamento e autógrafos Livro Wicca a Bruxaria Saindo das Sombras |
Gravação do DVD Wicca a Religião das Bruxas |
Capítulo
XVIII
Espíritos
e Crowley
Quando percebemos que a casa da
Rua Conde de Irajá estava pequena, fui apresentado pelo amigo ocultista C.R, aquele
que viria a ser meu instrutor na filosofia thelêmica de Aleister Crowley, a
besta do Apocalipse, o Pior homem do Mundo.
Aleister Crowley |
Frater QVIF 196 era um policial
Civil com um conhecimento excepcional sobre absolutamente TUDO. Falava línguas,
era egiptólogo, um dos mais graduados estudantes da filosofia thelêmica no País,
tinha tido contato direto com Marcelo Ramos Motta (Frater T.) e Euclides
Lacerda (Frater Thor), maiores autoridades em Thelema no Brasil. Frater QVIF
ainda era um Bispo Gnóstico, Maçom e membro de outras ordens, as quais nunca
tinha tido contato direto. Era tudo o que eu queria para reavivar minha sede de
conhecimento.
Imediatamente, graças aos gostos
em comum, formou-se uma grande e verdadeira amizade e através de Frater QVIF
comecei a conhecer Aleister Crowley e sua filosofia.
Mas quem foi Aleister Crowley?
Aleister Crowley foi sem sombra de dúvida o maior
mago do século XX. Suas explorações no campo das drogas e do sexo são
enfatizadas em demasia por quase todas as pessoas que se põe a falar sobre ele.
Essa sua faceta poderia ser explicada (talvez até possa ser justificada) como
uma fuga genial da pútrida sociedade ultra puritana em que foi criado.
O protestantismo vitoriano foi uma das
manifestações mais repressoras de que já se teve notícia e Crowley, juntamente
com alguns artistas de vanguarda de sua época teve a ousadia de se colocar
contra todo esse sistema de valores e criar um sistema próprio, que por pior
que fosse era melhor do que o sistema estabelecido.
Aleister Crowley |
A mente de Crowley, um misto de Nietzsche e
Rabelais, com uma estética egípcia e um negro senso de humor, era de certa
forma, inescrutável. Apesar de freudianamente seus complexos serem óbvios,
lendo Crowley nunca se tem certeza do que ele realmente quis dizer. Ele
brincava com o leitor, geralmente o superestimando (principalmente nos
primeiros livros, cheios de referências obscuras imprescindíveis para a compreensão
da obra). Apesar disto escreveu excelentes poesias, mas que de forma alguma
superaram o interesse do mundo na história de sua vida, atribulada, trágica e
cheia de aventuras como foi, por si só uma obra de arte.
Crowley nasceu em 1875, filho de um pastor de uma
seita fundamentalista protestante, que também era dono de uma fábrica de
cerveja. Seu pai morreu cedo, deixando boas lembranças no menino, mas sua mãe,
segundo ele, era uma "estúpida criatura", e as brigas da adolescência
logo fizeram com que sua mãe o chamasse de "Besta", apelido que
adotou posteriormente e que lhe trouxe boa parte da fama.
Na escola se mostrou brilhante e obediente, até
que foi culpado injustamente de um pequeno delito e foi posto de castigo, a pão
e água, o que piorou sua já fraca saúde (tempos depois lhe receitariam heroína
para a asma, substância que usou até os setenta e dois anos de idade, quando
morreu de parada cardíaca). Crowley nunca se esqueceu desse tratamento, e desde
menino começou a achar que havia algo de errado com o "senso comum"
da época. Decidiu ser um homem santo, e cometer o maior pecado, como em uma
lenda dos Plymouth Brothers (culto de seu pai) que afirmava que o maior santo
cometeria o maior pecado.
Na Universidade Crowley finalmente se encontrou. Com
muito dinheiro (da herança de seu pai) e livre da
repressão da família, exerceu
todas as atividades pelas quais ficou conhecido: alpinismo, poesia, enxadrismo,
sexo e magia, e, dizem, foi excepcional em cada uma delas. Crowley travou
contato com a Golden Dawn, uma ordem pseudo-maçonica de prática ritualística e
iniciatória que esteve em seu auge no fim do século passado, quando Crowley a
frequentou. Subiu rapidamente pelos graus da ordem, mas foi barrado por um
grupo de pessoas que chegaram a afirmar que a "ordem não era um
reformatório". Crowley era desconsiderado pelos intelectuais e desprezado
pela burguesia, fato que o pode ter levado a suas inúmeras viagens e expedições
de alpinismo.
Crowley Na Golden Down |
Crowley pode parecer extremamente arrogante e
narcisista em seus escritos, mas isso não parece ser verdade, se examinamos sua
vida a fundo. Ele sempre buscou o reconhecimento e aprovação das pessoas, e
quando notou que isso não era possível, mantendo sua crítica atroz aos absurdos
do puritanismo inglês, ele resolveu aparecer fazendo escândalos, reais ou
falsificados, ao estilo do estereótipo "falem mal, mas falem". Mesmo
assim em sua autobiografia ("Confessions of Aleister Crowley") ele se
mostrou extremamente magoado quando a imprensa marrom inglesa (conhecidíssima
até hoje e abominada pela família real inglesa) inventava alguma coisa absurda
e terrível ao seu respeito, como em uma ocasião em que o acusaram de comer
carne humana na expedição ao monte K2.
Crowley mais Idoso |
A Golden Dawn recusou iniciação a Crowley, mas
seu chefe, McGreggor Mathers não. Talvez interessado no dinheiro do jovem
Aleister Crowley ele o iniciou, e logo se tornou um mestre para Crowley.
Seus trabalhos mágicos e estudos místicos o
levaram as mais diversas partes do mundo, experimentando com todas as formas de
catarse e intoxicação, que considerava como bases da religião. Mas pouco a pouco
se distanciava de Mathers, que a essa altura já havia se proclamado em contato
direto com os "mestres" que regem a terra, e com isso seu
autoritarismo se tornou insuportável. Crowley foi o único a defendê-lo até o
final, quando percebeu que tudo não passava de uma farsa.
A crença de que existe um grupo de iniciados
secretos que carregam o conhecimento humano e são os verdadeiros
"chefes" da terra é compartilhada no sentido estritamente literal por
muitas pessoas e seitas. Crowley aceitou essa ideia de uma forma ou de outra
até o fim da vida, mas empregou diversas interpretações para estas entidades,
algumas baseadas na psicologia (recém-estabelecida como uma ciência por Freud,
na mesma época).
Mas, desiludido com a Golden Dawn, passou alguns
meses afastado da magia, e pouco a pouco se reaproximou, trabalhando sozinho.
Marcelo Ramos Motta |
Então numa viagem ao Cairo em 1904, recém-casado,
sua esposa começou a falar algumas coisas estranhas das quais ela não poderia
ter conhecimento. Ela o mandou invocar o deus Hórus.
Dessa invocação surgiu um texto pequeno, de três
capítulos, intenso e esquisito, ditado por um dos "ministros" da
forma de Hórus conhecida por "Hoor-Paar-Kraat", Harpócrates, Hórus, a
criança. Aiwass era o nome dessa entidade, depois reconhecida como o Sagrado
Anjo Guardião do próprio Crowley. Com isso três coisas estão subentendidas:
Aiwass era um dos "mestres" que regiam o presente Éon, dedicado ao
Deus Hórus, seu mentor; era também uma entidade não totalmente separada de
Crowley, embora devesse ser tratado como tal, alguns poderiam dizer que ele era
o self junguiano de Crowley (mesmo ele reconheceu isso), outros, maldosamente,
que era sua Sombra (termo que em psicologia junguiana designa a parte de nós
que reprimimos e que contém aquilo que temos medo de admitir); Crowley demorou
cerca de cinco anos para acatar o que o texto dizia. Uma das profecias previa a
morte de seu filho, que acabou por morrer mesmo, de doença desconhecida.
Quando finalmente aceitou o Livro da Lei estava
em contato com um corpo germânico de iniciados, que em outro livro dele
("The Book of Lies") encontraram um segredo de magia sexual que
pensavam ter o monopólio no ocidente. Nem Crowley havia entendido o que tinha
escrito, mas aceitou mesmo assim uma alta posição hierárquica na Ordem. Era a
Ordo Templi Orientis, que até hoje detém os direitos sobre os textos de Crowley
posteriores a 1910.
A O.T.O. existe até hoje (ou melhor, existem,
visto que houve cisões e brigas e etc, que somando com os charlatães, devem
somar mais de 30 O.T. Os., por alto. A maioria clama legitimidade.)
Crowley perdeu muito dinheiro publicando seus
próprios livros e os vendendo a preço de banana. E a incompetência de um
tesoureiro da O.T.O., que perdeu um galpão cheio de livros num lance mal
entendido até hoje, acabou causando sua bancarrota final.
Além da O.T.O. que tinha bases maçônicas, Crowley criou um corpo próprio, designado como A.:.A.:.., esse
corpo, muito
mais velado, deveria servir como que "escola de treinamento" para os
possíveis "mestres" da humanidade.
Crowley sobreviveu de doações e venda de livros até o fim da vida. E morreu em relativa miséria, ainda viciado em heroína, pouco tempo depois de terminar seu último trabalho, um livro sobre o Tarô que Lady Frieda Harris havia pintado com suas indicações. Um baralho magnífico.
Além da O.T.O. que tinha bases maçônicas, Crowley criou um corpo próprio, designado como A.:.A.:.., esse
Euclydes Lacerda - Frater Thor |
Crowley sobreviveu de doações e venda de livros até o fim da vida. E morreu em relativa miséria, ainda viciado em heroína, pouco tempo depois de terminar seu último trabalho, um livro sobre o Tarô que Lady Frieda Harris havia pintado com suas indicações. Um baralho magnífico.
Para mim, que estudava o ocultismo por toda
uma vida, encontrar um novo manancial como a filosofia e ordens de Crowley, era
tudo o que se desejava.
Imediatamente comecei a estudar a fundo
Thelema. Sob a supervisão de Frater QVIF, adentrei a ASTRVM ARGENTVM, braço
filosófico de Crowley, e em pouco tempo galguei alguns degraus dessa ordem.
Graças a minha amizade e dedicação a Frater
QVIF, comecei a receber do mesmo as instruções especiais, assim como cópias de
toda a documentação referente à história de Thelema no Brasil. Assim, passei a
ser o 5º na linhagem que derivava de Marcelo Ramos Motta no Brasil, sendo ela a
seguinte: Aleister Crowley, Marcelo Motta, Euclydes Lacerda, Frater QVIF e eu.
Adotamos no novo Templo de Brigith os cursos
de Tarot de Thot, Magia Thelêmica Kabbalah e tantos outros que tinham
referência a Crowley. Eu mesmo, nesse momento, comecei a traçar paralelos entre
os trabalhos de Aleister Crowley e Gerald Gardner.
Mas nem tudo eram flores nessa época. Foi
nesse período em que Eliane, profundamente envolvida com o Ciganismo (era uma
aficionada pelo Baralho Cigano e pela cultura daquele Povo), após traçar sua
ancestralidade e descobrir que tinha origens nesse povo, abandonou
definitivamente o catolicismo e me fez um pedido: Queria tornar-se uma médium!
Até hoje me arrependo de ter aceitado seu
pedido...
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