Capítulo
XXIV
Os
espíritos matam...
Mudamos
para a casa nova. Parecia que finalmente teríamos alguma paz, afinal existe o
ditado de que “Casa nova, vida nova”.
Estávamos
empolgados na arrumação da casa dos sonhos. Cada cantinho era projetado. Morávamos
eu, Eliane, Eduarda e Felipe (meus filhos), além de meu sogro, Seu Zé e minha
sogra Do Carmo. Adequei o quarto de meus sogros para piso frio, afinal eram
idosos e carpete causava alergias a idosos. Ao lado de nossa casa tínhamos um
terreno imenso, pertencente também à dona de nossa casa, o que possibilitaria a
Seu Zé a oportunidade de fazer o que ele mais gostava... mexer com a Terra.
Seu
Zé era o pai com quem não tinha tido contato na infância. Um senhorzinho de 72
anos de idade nessa época, mas com a disposição de um jovem de trinta anos.
Capinava, plantava, subia em coqueiros, tinha aquilo que chamamos de “dedo
verde”. Tudo o plantava nascia e crescia. Seu Zé era meu grande companheiro.
Cuidava dos cães, dos jardins, da casa, enfim, se a família tinha um pilar,
esse pilar era Seu Zé.
Apesar
da falta de estudo, ele mal sabia assinar seu nome, seu Zé tinha uma sabedoria
que só o tempo, a experiência e a idade podem dar. Considerava-me tão filho
quanto eu o considerava um pai e aprendi muito com esse homem.
Mas
seu Zé tinha uma grande tristeza em seu coração: A minha religião.
Apesar
de sempre ajudar na preparação das festas (Sabbaths) seu Zé não escondia sua
tristeza. Era um homem com suas manias e crenças. Quando um de seus netos
apresentava alguma doença, ele o colocava sentado no chão e passava a perna
direita três vezes por cima da cabeça da criança... e ela melhorava. Quando um
dos bichos (que eram sua paixão) ficava doente, Seu Zé sabia o que fazer, tanto
física quanto espiritualmente. Acreditava em Deus, tinha a Cristo como seu
Salvador, mas não seguia nenhuma religião, não ia a igrejas, mas orava em seus
momentos certos.
Estávamos
todos muito felizes. Nem os problemas com a ONG de Eliane nos tiravam o ânimo
de uma nova vida.
Nos
meses seguintes Seu Zé limparia o terreno, plantaria seu milho, aipim e feijão
de corda, e com que orgulho ele mostrava sua plantação a qualquer pessoa que
chegava a nossa casa. Um de seus maiores prazeres era de doar alimentos a quem
precisava. Perdi as contas de quantas vezes vi Seu Zé colher, secar e debulhar
feijão para doar a pessoas carentes das comunidades próximas. Todos os vizinhos
já conheciam aquele Senhor baixinho, careca, magrinho e sua bicicleta vermelha,
e não havia quem não gostasse de seu Zé.
Julho
de 2013 chegou e com esse mês, o período eleitoral.
Não
vou aqui gastar a paciência do leitor com as mazelas dessa eleição. Com as
traições, incompetências do partido e com a luta para conseguir as ações
eleitorais. Apenas deixo claro ao leitor que, nada do que havia sido acordado
foi cumprido e com isso, mais uma eleição foi desperdiçada. Sem placas nas
ruas, sem distribuição dos famosos “santinhos eleitorais”, sem nenhuma ação de
divulgação fora a internet. E mesmo assim, consegui mais de 4.700 votos para
Deputado Federal, graças ao meu trabalho com a proteção animal.
Numa
tarde de domingo do início do mês de Agosto, seu Zé tinha acordado cedo.
Cuidará de sua plantação e tinha levado Felipe, que nessa época tinha 1 ano e 9
meses, para passear e conhecer os legumes que plantava. Tenho a última gravação
de vídeo de Seu Zé se divertindo com meu filho. Ele era um avô daqueles
carinhosos, que fazia questão de cortar frutas para o neto, de fazer balanços
em árvores para a neta, enfim... daqueles avôs de antigamente.
Minha
sogra se preparava para ir passear com Eduarda na feirinha da praça próxima de
minha casa Uma dessas feiras que vendem roupas e brinquedos. Seu Zé iria junto,
pois queria doar feijão para uma pessoa necessitada que o esperava na feira.
Minha esposa arrumava a casa e eu estava na sala, com Laptop no colo, me
inteirando das notícias.
Saudades de Seu Zé |
Lembro-me
que, por voltas das 18h, quando começava a escurecer, lá estava seu Zé com sua
bermuda, camiseta, já pronto para acompanhar minha sogra e minha filha a feira.
Meia hora depois, minha sogra desceu as escadas com minha filha, preparada para
sair. Fez o que deveria na cozinha, arrumou o que deveria arrumar e começou a
chamar por Seu Zé.
A
insistência de Do Carmo em chamar seu Zé sem resposta, chamou minha atenção.
Levantei-me do sofá e me juntei à busca. Achávamos que ele poderia ter
desistido de esperar e que teria ido sozinho a feira, apesar de não ser do
feitio dele.
Peguei
meu celular e comecei a telefonar para o aparelho de Seu Zé. Inicialmente
comecei a escutar ao longe o toque de seu celular. Achei que poderia estar no
canil, cuidando dos cães, que fica na parte inferior da casa e para lá fui.
Nada de Seu Zé.
Continuei
telefonando e ouvi o toque que vinha do terreno ao lado da casa. Para ter-se
acesso a esse terreno, tínhamos que atravessar uma laje ao lado de minha casa e
descer por uma escada de metal em caracol por uns 8 metros. O terreno tinha
iluminação, que era ligada de minha casa, mas naquele dia as luzes estavam
apagadas, afinal, havia acabado de escurecer. Imediatamente acendi as luzes do
terreno, quando vi Seu Zé deitado no terreno, de costas para o chão, com as
pernas cruzadas, como quem está descansando.
Num
primeiro momento, minha mente não conseguia imaginar nada de errado, apenas
achei estranho Seu Zé deitado no terreno. Minha sogra ao ver a cena, com o
acender das luzes gritou:
-
Fabiano, pelo amor de Deus, o Zé caiu da laje.
Aquele
grito entrou em meu cérebro como uma faca. Ela tinha razão. Não havia
possibilidade de ser uma brincadeira o fato de estar deitado no terreno.
Não
me recordo como desci ao terreno. Não me recordo desses segundo. Meu cérebro
estava completamente embotado em meu desespero.
Grande COmpanheiro |
Quando
me aproximei daquele pequeno homem deitado na terra, pernas cruzadas, inerte,
imediatamente chamei por seu nome. Percebi que seus olhos estavam abertos e um
pequeno filete de sangue brilhava em seus lábios.
Meu
coração parecia que explodiria. Era um misto de sensações que até hoje não
consigo, nem quero explicar.
Pedi
a Seu Zé que ficasse calmo, que não tentasse falar. Imediatamente gritei para
minha sogra para que ligasse para a ambulância. Vizinhos foram chamados e
durante os seguintes 30 minutos sofremos em angústia até a chegada dos
bombeiros.
A
operação de guerra foi montada para o resgate de Seu Zé. A Laje dificultava a
retirada dele do terreno. Tivemos de passar por dentro do canil, através de uma
porta lateral que dava para nossa casa.
Seu
Zé chegaria ao hospital no Centro da Cidade por vota das 21:30 daquela fatídica
noite. A última imagem que me recordo foi a de minha esposa em desespero, com
meu filho no colo dentro da ambulância, se despedindo de seu Pai e pedindo que
ele retornasse, quando ele olhou para o neto querido e tentou levantar a mão na
fora de um até logo.
Naquela
madrugada, por volta da 01:15 da manhã, eu perdia um Pai e um grande amigo,
vítima de fraturas nas vértebras t4 e t5 e múltiplas perfurações internas.
Até
hoje não sabemos como aconteceu. Imaginamos que ele tenha ido recolher o feijão
que havia deixado para secar na laje e, com a vista debilitada pela idade,
teria caído da laje.
Passamos
pelos ritos funerários, pela dor da perda e nas semanas seguintes recebemos a
solidariedade e valorosa ajuda de S. e seu esposo D. Suas palavras sobre a
salvação, Deus e um Cristo vivo foram fundamentais para minha esposa e sua mãe.
Com
essa aproximação maior do D. e S., também minha esposa se aproximou
definitivamente de Jesus. E foi essa aproximação que nos trouxe o que seria uma
revelação pavorosa.
Apenas
três semanas após o falecimento de Seu Zé, durante uma das visitas de D. e
S., Eliane manifestou seu demônio pessoal.
Ela
já não manifestava a mais de um ano. Tinha deixado de fazer as suas obrigações,
de alimentar e presentear sua entidade, apesar das cobranças da mesma ainda
existirem, e vinham através de sonhos, mas Eliane não a queria mais em sua
vida.
Mas
ela veio, e veio com força. D. imediatamente a controlou, usando de seus
conhecimentos e da unção que tinha recebido quando ainda um frequentador da
IURD. Era aquela mesma entidade que se autodenominava Padilha da Rosa Vermelha,
aquela mesma com quem eu brigara nos últimos anos e que teria sido a
responsável pelo meu “acidente”.
A
entidade estava enfurecida. Xingava e tentava agredir as pessoas. D.
imediatamente a controlou e começou a entrevista-la. Não demorou muito até que
ela confessasse...
-
Fui eu que matei o Pai dessa ingrata. Eu o empurrei da laje!
Nesse
momento todos os presente gelaram. D. procedeu como deveria, expulsou a
entidade para que nunca mais fosse capaz de voltar e Eliane voltou à
consciência, sem lembrar-se de nada.
A
libertação de Eliane tinha começado, e iria ser finalizada alguns meses depois
na Igreja Universal do Reino de Deus, mas tão importante quanto, naquela tarde
eu dei o meu basta.
Para
mim, o contato com o oculto deveria terminar ali. A revolta com meus Deuses era
gigantesca, a inconformidade por ter perdido meu “Pai” e por todas as mazelas
que teria passado nos últimos anos me levavam naquele momento a renegar TUDO o
que já havia acreditado.
Naquela
tarde dei meu primeiro passo em direção a Jesus, mesmo sem sequer ainda ter
consciência disso.
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